A menina do cabelo azul [32] - Até que nada mais importe

Era noite, em torno de onze horas de sábado quando chamaram Manu no portão de sua casa.

- Caio! – Ela sorriu feliz em vê-lo.
- Desculpa, eu sei que a festa é só para meninas, mas não vou ficar não. Só vim para te dar os parabéns pessoalmente, não resisti. – Ele mostrou um buquê um tanto diferente, de bombons, Manu arregalou os olhos encantada enquanto o pegava.
- Meu Deus! Que sonho! Ouro branco é o chocolate que mais gosto, mas nossa, só tem os que gosto aqui... – Falou olhando o buquê. – Amei, arrasou!

- Sei o quanto você gosta de chocolate! Minha mãe me ajudou a fazer. E aí, é melhor que o de um mês atrás?
- Eu amei... os dois! Sem dúvida!
Eles se abraçaram, cheios de afeto e Caio a parabenizou. Ele estava bastante envergonhado. Quando se afastou disse:
- Peça desculpa a sua mãe pela hora, já vou indo. A gente se fala melhor na segunda, na escola. – Ele foi andando para longe, de costas.
- Mas quem disse que eu quero que você vá?
Caio parou e a encarou, ambos sorriram. Ele mordeu os lábios, simplesmente amou aquela cena. Por quê? Ele não entendia bem. Vê-la assim, parada, encantadora, com um olhar iluminado e um buquê na mão, era mais do que ele esperava. Só vê-la já era muito prazeroso. Mas naquele breve momento, que ele se afastava e ela o chamou de volta, sua feição denunciava o anseio para que ele ficasse, isso o desmanchava por dentro. Ele não queria ir. Era sempre assim. E ver isso tão nítido no olhar dela tirou Caio do rumo. Ele passou a mão no cabelo, desconcertado. Manu achava um charme quando ele fazia isso. Sem pensar muito ele pegou o celular e tirou uma foto dela.
- O que isso, Caio? – Ela não esperava.
- Não resisti, você esta muito linda.
- Mesmo com essa cara de choro?
- Isso nunca foi problema para você. – Ele se aproximou dela.
Eles se olharam nos olhos por uns instantes, dentro de ambos o sentimento parecia explodir. Manu o abraçou de novo e fechou os olhos.
- Gosto muito de você. Mesmo que a gente não fique juntos, Deus me mostrou que príncipes existem, sabia?
- E Ele me mostrou que princesas, nobres, cheias de caráter e bravura, e o mais incrível, com o cabelo azul, são reais. – Ela sorriu deixando uma lágrima escorrer.
- Ai, você acaba comigo. Curto muito essa sua fé e paciência, seu desejo em fazer a vontade de Deus é admirável.
- Só não abro mão do melhor.  Por mais difícil que seja... – Ele colocou a mão no queixo de Manu olhando para sua boca – Pelo amor de Deus, vamos entrar!
Ela riu e o puxou para dentro. Eles respiraram fundo enquanto andavam pela casa a caminho da varanda de Manu.
- Vem, quero te mostrar algo.
- Mas já acabou a festa?
- Esta no final. Mas olha só...
Eles pararam na janela da cozinha e Manu puxou a cortina para que ele olhasse as meninas na varanda. O ambiente estava meio escuro com velas acessas em pontos estratégicos, bastante aconchegante. Havia um data-show que projetava letras de músicas em uma parede, as meninas estavam sentadas em almofadas e uma das amigas de Manu tocava e cantava. Caio reconheceu várias meninas da escola, todas cantavam e se derramavam nas músicas, choravam e se abraçavam. A presença de Deus era tão forte que arrepiou Caio por inteiro. 
- Uau! O que é isso?
- Deus! – Manu sorriu, satisfeita.
Caio olhou para Manu, ainda mais impressionado com ela.
- Nos já estamos assim há horas. Marquei o aniversário para as dezoito horas, pra não acabar muito tarde. Conforme elas chegavam distribuímos umas entradinhas de comida e começamos com um louvor. Eu cantei e fui explicando o que estava acontecendo. Conforme eu cantava, eu dava pausas contando meu testemunho e falando do Deus que eu conheço e amo. Foi tudo tão gostoso, tão natural, leve, fluindo. Deus se manifestou de forma lindíssima e muito profunda.
- Estou vendo!
- Quando acabei meu testemunho, todas estavam muito mexidas. Falei que hoje podia ser um novo começo para elas, de conhecer Deus de verdade e de deixar Ele no controle da vida delas. De aprender se amar como elas merecem, através dele. Cara, foi sensacional! Aí quando as coisas acalmaram, comemos. Até se esquecemos desse “detalhe”, comer! – Ela riu – Enquanto comíamos, elas disseram que queriam cantar mais. Aí minha amiga esta lá... Faz uma hora.
- Estou sem palavras. – Caio não conseguia parar de olhar para as meninas.
- Daqui a pouco elas devem ir embora... Ainda estou muito emocionada. – Disse, respirando fundo.
- Imagino... Não tem noção de como estou orgulhoso de você. – Ele a olhou, admirando-a. – Como consegue? Como você faz coisas assim?
- Sinceridade. Um coração sincero e entregue. Eu jejuei a semana toda também, lembra? Me consagrei! – Ele acenou a cabeça – A adoração é algo que atrai a presença de Deus de uma maneira fora de sério, é um momento de quebrantamento, agradecimento, reconhecimento de quem é Deus pra você. Eu fico triste quando vou a algumas igrejas e vejo o louvor cair na normalidade. As pessoas só cantam, grande coisa! Senão for de coração, não tem proveito algum. As pessoas não tem noção da glória que o louvor pode gerar, não se compara com nada que esse mundo tem. É outra dimensão, outro nível. É isso que Ele tem pra nós.
- E tem um detalhe nisso, estava pensando enquanto você falava. Não tem como a pessoa adorar a Deus, reconhecer... alguém que não conhece. Ouvir falar, ler a Bíblia apenas não é conhecer. Conhecer é no dia-a-dia.
- Com certeza. Intimidade.
- Você esta certa, Manuzinha. Estamos falando de Deus... Não tem como conhece-lo e não se extasiar, se render, adorar com intensidade.
- O que eu percebo é que as pessoas se envolvem com as coisas da vida de tal forma que vão esquecendo essa percepção dele.
- A forma que você adora fala muito sobre como você vê Deus. É um termômetro da sua intimidade.
- Gente, amei! Toca aí! – Eles fizeram um toque com a mão.
Caio olhou mais uma vez as meninas e olhou para Manu:
- É bom ter pessoas que nos lembrem disso.
- É melhor ainda ser alguém tão próximo de Deus, que isso nunca caia no esquecimento.
- Eu quero isso!
- É minha maior preocupação. Quando colocamos Deus no lugar que realmente é dele no nosso coração, nada mais é tão importante.
- Até que nada mais importe... Temos que buscar a Deus até nada mais importe tanto.
- Afinal, isso tudo passa.
- E não faz sentido não ter prazer em adorar... se é isso que faremos lá no céu, por toda eternidade.
Os dois se olharam ternamente e se levantaram, a festa tinha terminado. As meninas iam embora, era hora de arrumar a bagunça. Caio não disfarçava o quanto olhava para Manu, “até que nada mais importe” se cravara em seu coração. Ele queria ser melhor e ele se encantava ainda mais por Manu o proporcionar tal desejo.

Continua...