A menina do cabelo azul

Ela tinha cabelo azul, jeito moleca, Manu tinha 16 anos, mas ainda vivia em um mundo só dela. Na escola, as meninas a olhavam com preconceito, "estranha" diziam. Ela não se incomodava. Sorria da vida. Seu grude era Pietra. Bem doidinha, talvez por isso se dessem tão bem. Se conheceram no começo do ano no colégio, e desde a primeira conversa foi pura sintonia.

Certo dia, o tênis de Pietra perdeu a sola no meio da aula de educação física. As meninas riram, os meninos olharam. Pietra por breves instantes perdeu o rumo, paralisou. Manu, não pensou duas vezes, arrancou os tênis, jogou no canto e gritou "sem tênis é melhor!". Todos olharam confusos. Ela pulou em cima de Pietra fazendo bagunça e quebrou o clima estranho que estava no ar. Pietra olhou para Manu, agradecida. As duas riram, tinham uma amizade muito bonita. Foi então que viram um menino olhando Manu, ele era novo e sua beleza não passava despercebida.

- Gatinho, hein? - Comentou Pietra.
- Jeito romântico de ser ver pela primeira vez, não?
- Se fosse normal, não seria você.
- Nem é tudo isso. - Manu tentou disfarçar.
Quando a aula acabou, foram para o vestiário trocar de roupa. As meninas estavam todas oriçadas pelo menino novo, nunca tinha entrado um menino tão bonito na sala. Manu e Pietra pra variar, eram as últimas a ir pra sala. Manu adorava fazer tranças e isso literalmente, não tinha hora.
- Estamos atrasadas Manu.
- Estou quase acabando Pietra! Sossega!
- Não gosto de chegar atrasada.
Ia Pietra andando rápido e Manu pendurada na trança dela tentando acabar.
- Oh bonita, cadê suas coisas?
- Ué, não estão com você?
- Não.
- Vou buscar, vá lá, guarda nosso lugar.



Quando Manu foi buscar, viu a menina mais "bonita" da sala, Suzana, indo falar com o menino novo, Caio. "Casal da vez" pensou. Quando chegou ao vestiário suas coisas não estavam lá. Manu saiu procurando pela escola. Até que lembrou de ir à secretaria. Quando virou um corredor perto dos banheiros viu Suzana com cara de choro.
- Suzana, o que foi? Tudo bem? - Correu, preocupada em ajudá-la.
- Para com isso, ninguém pode me ver assim. - Tentou se esquivar.
- Fala! - Manu e sua vontade insuportável de ajudar, era mais forte que ela.
- O menino novo é prepotente. Acho que é evangélico. Falou que me visto como prostituta.
- Ah, não. Só pode estar de sacanagem. Vem cá!
Manu, irritada, pegou na mão de Suzana e foi falar com Caio, que estava com dois amigos e se supreendeu com a chegada de Manu.
- Você é maluco? Como você fala uma coisa assim pra ela?
- Por que esta a defendendo? Olha a roupa dela.
- E quem é você pra julgar?
- Alguém que conhece a verdade. - Apontou para um pingente de cruz que carregava no pescoço.
- A verdade é uma só. Usar parte dela te faz um hipócrita.
- Do que esta falando?
- A Bíblia é a verdade. Você não deve usar só a parte que te interessa.
- E quem é você pra falar sobre isso?
- CTPA lhe soa familiar?
- Você? Com esse jeitinho?
- Eu sou evangélica Caio. Surpreso? Pois vou te falar, quem esta surpresa em você ser, sou eu.
Manu virou para Suzana e a chamou para ir embora.
- O que é CTPA? - Suzana não entendeu.
- É um dos melhores cursos de teologia da região.
- Uau, você fez?
- Sim. Eu também sei a verdade. Só que tento praticar.
Suzana sorriu com semblante aliviado. As duas deram um abraço apertado e carinhoso, e voltaram pra sala conversando. Ela pediu que Manu e Pietra sentassem com ela e suas amigas. Pietra ficou em choque.
- Que isso novinha? Vai pegar o material que esqueceu, dá fora no boy, faz amizade com as pop, se revela a teológa e leva falta, tem algo mais que preciso saber?
- Levei falta?
- Deu não, tentei enrolar o professor, mas preciso melhorar nisso. Depois tu me conta o que houve em detalhes hein?
- Pode deixar!


- Manu, é verdade que você canta e toca na igreja? - Indagou Suzana na hora do intervalo.
- Sim. Como soube?
- Face! - Se virou para pegar algo - Aqui - Deu um violão pra ela. - Canta pra gente.
Suzana olhou pra Manu com olhar admiração, totalmente avesso ao de dias anteriores. Manu, sem graça, sorriu. Pegou o violão e começou dedilhar. Aos poucos, uma melodia surgiu e Manu começou cantar. E como cantava, voz suave, envolvente, gostosa de ouvir. Agudos perfeitos. As meninas se olhavam maravilhadas. Pietra estava arrepiada e encabulada. As duas conversavam tanto, mas Manu era uma caixa de surpresas, sempre tinha mais.
De longe Caio passou com seus amigos. Olhou com ar arrependido. Manu desviou o olhar. Mas ele, ele não. Pietra notou, seu foco era ela, só ela.
O intervalo acabou. As meninas se dispersaram e Caio se aproximou.
- O que quer?
- Pedir desculpas. Não queria que nossa primeira conversa fosse assim.
- Você fez por merecer, não?
- Totalmente. Desculpa.
- Tudo bem. - Disse Manu se levantando de uma escada que estava sentada.
Manu estava meio desligada, mas Pietra, notando a feição de Caio, provocou:
- E como você queria que fosse sua primeira conversa com ela?
- Assim...
Ele se afastou e voltou devagar fingindo não conhece-la:
- Oi, licença. A moça da faxina me perguntou se eu conhecia uma menina de cabelo azul pra entregar esse material - Tirou do bolso - e eu me lembrei de você. Não tinha como não. Aqui esta. - Deu um sorriso envergonhado e entregou o material a ela.
Manu olhou para Pietra naquele longo papo que só grandes amigas tem e sorriu agradecendo. Ele continuou:
- Era isso. Entregar o material para uma garota bonita. Mas agora não mais.
- Virei feia? - Manu indagou. Pietra soltou uma risada.
- Não é "só" uma garota bonita. É inteligente, sábia e cristã.
- Nooooossa! - Pietra comemorou
Os dois olharam para Pietra que tentou disfarçar a empolgação. Manu encarou Caio desconfiada e foi saindo:
- Obrigada!
Pietra foi atrás dela.
- Isso aí amiga, tem que ser difícil.
- Não é ser difícil. Isso que deveria ser normal. Eu nem sei quem é ele.
- Verdade. - Disse pensativa.
- O que foi?
- Sei lá, é que o que me fez ter vontade de ser sua amiga foi seu jeitinho diferente. Cabelo azul, risonha e divertida. Livre sabe? Você não liga para padrões. E você é cristã! Isso é meio confuso pra mim. Você é super inteligente, bem resolvida e isso sempre me pareceu características de pessoas nerds ou metidas.
- Esteriótipos.
- Doença de quem?
- Esteriótipos miga. É a imagem que nos temos das pessoas segundo a categoria que ela pertence. Quando muitos pensam em evangélicos, imaginam pessoas sérias que mal saem de casa, fanáticas, chatas. Oi? Quem disse? Mesma coisa quanto as nerds, quem disse que tem usar óculos e ser bitoladas. Quem disse que tenho que estar toda maquiada e no salto pra ser confiante?
- Cara, tú é sinistra. Gosto disso. Mas de uma coisa eu estava certa. Você é livre mesmo. Livre de esteriótipos, por exemplo.
- A maior liberdade que existe é da mente, nega. - Disse sentando em seu lugar na sala.
- E como conseguiu isso?
- Com o criador dela. - Sorriu.


FIM (ou continua)
Gostaram meninas? Se gostarem, escrevo mais!
Beeijos