sábado, 16 de julho de 2016

A menina do cabelo azul [7]


- Então você gosta tanto de mim assim? Para querer orar comigo. – Manu indagou, ainda surpresa.
Caio suspirou devagar. Seu semblante era sereno e bastante sincero, parecia estar centrado só nela e bastante confortável por isso.
- Eu te admiro, Manu.
Ele não podia ter usado palavras mais certeiras. Para Manu, não existe amor entre um casal sem admiração. Essa foi uma lição marcante que seu pai lhe deu e ela acreditava grandemente. Observava a sua volta. Quando a gente admira alguém há elogio, há respeito, há senso e limites. Quando um perde a capacidade de ver o que há de bom no outro é hora de recomeçar, voltar a lembrar a razão de tudo, de estarem juntos, o que os atraiu um no outro. Caio a admirava, sua fala dizia isso, mas não tanto como seu olhar.

- Mas eu não sou perfeita. Não quero que se decepcione.
- E eu sei disso. Inclusive, isso me faz lembrar de algo gosto muito em você.
- O quê?! – Manu ficou constrangida.
- Você faz graça dos seus erros e simplesmente... tenta melhorar. Não fica cheia de culpa ou deixando isso travar sua vida. Você ri. Isso é... – Olhou para o lado, tentando buscar uma palavra. – Fantástico!
Manu ouvia tudo com atenção e com uma timidez que não lhe era normal. Enquanto ele falava ela apertava forte seus dedos. Caio percebeu e colocou a mão em cima da dela. Ela ficou sem reação, ele continuou:
- Eu só queria saber se sente algo por mim também. E se você quer orar comigo. Você ainda não respondeu.
- Olha Caio, eu nunca namorei. É uma área nova para mim, ou seja, estou aprendendo lidar. Mas eu acho que o fato de eu estar nervosa assim, é... Para de me olhar assim, estou com vergonha.
Caiu não conseguia disfarçar suas expectativas e abriu um grande sorriso. Foi aí que Manu desmontou, viajando nos contornos de seu rosto. Nunca tinha prestado tanta atenção. Sua garganta ficou seca, mas uma coisa ela não podia negar: estava estupidamente feliz.
- Sim! – Ela soltou. – Só que tem uma coisa – Ela olhou para cima, inquieta – Nada de toques, beijos, muitos abraços e tals.
Caio respeitou, até tirou a mão da mão dela, mas estranhou que ela não parava de olhar para cima e olhou também.
- Tá, mas por quê?
- Porque tocar, beijar, muito contato físico mexe com o emocional. E isso atrapalha super em saber a vontade Deus.
- Olhar também? – Ele brincou já que ela só olhava para cima.
Ela olhou para ele e admitiu.
- Com você é quase isso. - Deu uma risada de canto de boca.
- E você acha que com você não?! - Ele levantou a sobrancelha - Por que acha que sempre faço cara de bobo quando te vejo? - Caio perguntou com ar de criança arteira e sapeca.
- Caraca Caio! – Manu se incomodou.
- O que foi?
- Você se esforça ou é natural?
- Hum? Não entendi.
- Você é muito fofo! – Manu falou com tom de raiva.
- Tá bom, se quiser que eu pare, eu paro. – Levantou as mãos como que se rendendo.
- Nem ouse! - Manu o fulminou com o olhar - Não é maluco!
Eles riram. Ela ficava sem graça, perdida, mas amava a sensação de frio na barriga, aquela sensação de ser conquistada. Manu continuou:
- Mas eu tenho uma pergunta, você acha isso mico depois? Tipo "caraca, não acredito que falei isso!".
- Você e sua sinceridade. Bom, algumas vezes sim...
Caio ficou instantaneamente acanhado e Manu não se aguentou. Apertou as bochechas dele.
- Ai Manu, tá doendo!
- Culpa sua, fez uma carinha de dozinho tão linda!
- E o contato físico? Só vale para mim?
- Com certeza. Dá vontade de apertar coisas fofas! – Manu imitou garras com suas mãos.
- Tu sabe que é doidinha né?
- E você é mais ainda de querer namorar comigo...


- Ai amiga, vou desabafar com você. Assim, ele tem sido maravilhoso. Conversamos todos os dias. Ele me faz bem, é da igreja, tem um papo legal. É uma graça! Até sentamos juntos no culto. Estou animada, confesso que... acho que estou gostando dele mesmo, nunca senti isso. E, você não sabe o que aconteceu? Ontem, nós nos beijamos.
- O quê? Você não esta falando sério Pietra? – Manu não conseguia acreditar.
- Ora, o que tem amiga?
- Você conheceu esse menino há poucas semanas.
- E ele tem me feito muito bem.
- Ele é aquele menino que você conheceu na igreja que está indo perto da sua casa?
- Sim.
- Você tinha me falado que estavam conversando, não que já estava gostando dele assim.
- E o que tem Manu? Você fala como se fosse algo ruim. Estou feliz! Não é isso que importa?
- Miga, a Bíblia fala que o coração é enganoso, temos que ir com calma. Igual eu e o Caio, se conhecemos há meses, convivemos todo dia, e ainda sim estamos orando a Deus. E eu nem dar a mão para ele estou dando.
- Foi até bom você tocar nisso. Acho exagero nega, tadinho. Vejo que as vezes ele tem vontade. Mas tenta ser forte.
- E que bom por isso. Pietra, temos que conversar melhor. Desculpe se minha reação foi meio assustada. Desculpa mesmo – Manu respirou fundo e tentou ser mais compreensiva e amiga - Mas é que você conversar com um cara é uma coisa, outra é estar super afim dele. Concorda comigo? São níveis diferentes, não são?
- Sim, são.
- A questão é a seguinte, existem três aspectos que conduzem nossa forma de viver: o espiritual, o racional e o emocional. O espiritual você está conhecendo agora. E muitas vezes, ele e o racional podem ser grandes parceiros, ainda mais quando o assunto é encontrar alguém legal. Já o emocional, fofa do meu coração, ele pode dar um rasteira nos outros senão for controlado. É aí que entra o esse lance de tocar, beijar, abraçar muito. Isso super alimenta o lado emocional e cria uma certa ligação com a outra pessoa. Você se sente atraído, próximo e quer sempre mais. 
- Até que faz sentindo – Pietra estava incomodada em ouvir aquilo.
- Como você vai saber discernir bem, ver se ele presta, se o lado emocional está mais forte que o racional? Como você vai ouvir a voz de Deus se o aspecto emocional esta bombando? Como eu te falei, até na igreja tem gente que não presta. E eu te amo muito para te ver sendo precipitada. Estou sendo bem sincera com você.
- Você não acha que está sendo um pouco pessimista? Por que não simplesmente deixar rolar e ver o que acontece? Se for de Deus dá certo.
- Primeiro ponto nega, não tem como algo dar certo se já começa errado.
- O que está errado, meu Deus?! Eu não entendo. – Pietra estava ficando irritada.
- Você está ignorando completamente a opinião de Deus. Ele quer que você esteja com esse rapaz? É isso que Ele sonhou para você? Se Deus é tão importante, como você não dá a mínima para saber a vontade dele? Começar um relacionamento sem a aprovação de Deus é começar errado. E é meio loucura você começar de qualquer jeito e esperar que do nada Ele venha e abençoe.
- É, você está certa. - Pietra estava caindo em si. - Eu não devia ter beijado. 
- E eu também não achei isso legal da parte dele não. Se ele é da igreja a mais tempo que você devia saber essas coisas e te explicar. Te pedir para orar com ele, não te beijar.
De repente surgiu Caio com alguns doces na mão, era hora do intervalo:
- Aqui estão as meninas mais bonitas da escola! – Caio entregou um doce para Pietra e outra pra Manu.
Ele foi e parou do lado de Manu. Pietra, ainda focada no assunto perguntou:
- Caio, por que você não é mais carinhoso com a Manu?
- Do que está falando? – Caio estranhou e olhou para Manu, que transparecia paz. Ele notou que o incomodo não partia dela. – Eu não acabei de ser?
- Abraços, de vez em quando pegar na mão dela, isso não tem nada demais... - Pietra tentou ver o que um rapaz cristão pensava.
- Essa lição já aprendi. O erro é exatamente esse, pensar que não tem nada demais. Essa frase “nada demais” é a mais versátil que existe. No começo, pegar na mão é nada demais, depois ficar abraçado e beijar é nada demais... Ela vai se adaptando a cada nova realidade. Toda vez que você aceita esse “nada demais” o próximo passo é certo. E eu quero ir para o próximo passo porque Deus mandou, não porque eu me readaptei.
- Uau! – Pietra olhou para Caio e Manu, bastante impressionada.
Manu viu simplicidade em Caio, ele estava amadurecendo muito desde a primeira vez que se viram. Ela ficava orgulhosa.
Pietra ficou pensativa e confusa. Parte de si estava apegada ao menino e queria acreditar que daria certo, mas outra parte via divergências grandes com o que Manu e Caio falavam e viviam. Ela ainda não sabia o que fazer...

Continua...
Beijinhos

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